MINHA BUNDA

                                                                          Saudade

E no ateliê do artista, a mesa ficou pequena 

para tantas e tantas coisas que amontoava ao seu redor enquanto criava.

Para tudo dava a sua arte e seus olhos encontravam arte em tudo.

Os sapatos velhos que encontrou na estrada tinham arte neles,

mas por estarem desatentos, muitos passaram e não perceberam a arte ali.

As coisas quebradas e muitos pedacinhos de tudo que não se usava mais,

reuniram-se numa bela composição eclética e harmoniosa.

Difícil explicar como pensa o artista

e fácil de entender porque prefere cercar-se de tudo que gosta.

Pensativo, o artista sonha com tantas coisas 

e vive em planos diários que fazem elevar sua esperança.

Busca sua alegria diariamente criando 

e as palavras quando começam a se acumular por alguns dias sem escrita,

gritam naquela alma esperando a liberdade exterior.

A escrita compadece de forma espetacular.

É uma arte que pode ter todas as cores sem cor.

Uma arte que pode dizer: Azul!

E se fará o azul na mente de quem lê sem que preciso seja:

a tinta, o pincel e a tela!

Mas é preciso ter contemplado um belo céu azul 

para sentir quão infinita pode ser essa cor.

É preciso sentir primeiro.

Uma palavra nada vale se não trouxer o retorno de um sentimento.

Se alguém nunca sentiu saudade, não poderá suspirar ao ler essa linda palavra.

Uma palavra presente na poesia, no amor da língua portuguesa e também na música popular.

"Saudade" descreve a mistura dos sentimentos de perda, falta, distância e amor.

Mas é um sentimento e senti-lo torna a palavra real.

Sinto saudade! Sinto sua falta! Sinto uma perda! Sinto a distância.

Os quilômetros entre as pessoas podem se transformar em tantos sentimentos e vontades.

Palavras fazem lembrar de lugares, cheiros fazem lembrar de comidas,

comidas fazem lembrar de pessoas e pessoas trazem a saudade de volta.

Ela vai e volta.

Enfim podemos ser artistas.

Juntar muitos pedacinhos de coisas que vivemos e fazer nossas belas composições.

Deitar na grama olhando o céu e as árvores,

lembrando pedacinhos encantadores de momentos que vivemos com tantas  pessoas.

Olhar o mar e rir de novo das mesmas piadas que provocaram nossas risadas no passado.

Lembrar do cheiro e do gosto da comida, que não pode ser separada do sorriso de quem preparou.

Nos sentimos amados e a saudade vem trazendo lágrimas.

É tão simples amar a arte!

Não há esforço algum, mas nos faz sentir tantas coisas ao mesmo tempo.

É como a saudade...

A arte é uma saudade constante de criar e fazer e refazer e sentir e chorar e doar e rir e amar...

E começar tudo de novo.

Coroamos uma obra de arte com todos os sentimentos e penduramos na parede.

O artista distribui seus pedaços depois de amontoá-los.

Distribui suas palavras depois que escreve.

Distribui seus olhares em suas fotos.

Distribui seus alimentos.

Suas ações.

Suas cores.

Sua saudade.

Sua esperança.

Difícil explicar como pensa o artista

e fácil de entender porque prefere cercar-se de tudo que gosta.

Assim ele cola seus pedacinhos e se recompõe.

E retorna...

Como a saudade.